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A OFERTA DE JESUS - Um paralelo entre JOÃO 2:11-25 e SALMO 121

INTRODUÇÃO
Esse texto parece que não é comum para quem está acostumado a ler um Jesus que usa as mãos para abraçar crianças, tocar em leprosos e curar enfermos, cear com pecadores, e até receber os pregos na cruz do Calvário. Aqui, ele segura um chicote nas mãos. O chicote anunciava por suas mãos que algo estava errado. Aquilo como era para ser foi alterado. E tudo aquilo que é alterado, o que podemos chamar de self, ou seja, o que vem para adicionar, além do que o original – e não todo o ser como pensava Jung. É o si mesmo que Jesus dizia para negar. É a construção sobre a imagem e semelhança de Deus. E para que se tenha essa semelhança de Deus, é preciso primeiro se desassemelhar, como Bonhoeffer aplicava em seus conceitos.


HISTÓRIA

Na cultura israelense, há três grandes festas conhecidas como as “Festas da Peregrinação”. “Quando o templo ainda estava de pé, os judeus faziam uma peregrinação a Jerusalém para entregar suas ofertas durante três festas: Pessach (Páscoa), Shavuot (Festa das Semanas) e Sucot (Festa das Cabanas). Os que viviam fora de Israel, tinham de vender parte de sua colheita e enviar o dinheiro para comprar oferendas e ajudar a cuidar do templo e dos sacerdotes. Pessach, a páscoa judaica, é a festa que celebra o êxodo do Egito. Agora que não há mais o templo, os judeus celebram essas festas em casa e na Sinagoga”.

CONTEXTO

Jesus já havia iniciado seu ministério. O primeiro milagre, retratado no início do capítulo, já apresentava as testemunhas e os experimentadores da água transformada em vinho. Após a festa em Caná da Galileia, rumou Jesus para Cafarnaum, onde tinha sua base, seu suposto descanso, onde era a “cidade de Jesus”, segundo Mateus. Ali, Jesus fica não muitos dias com seus discípulos e familiares. Realiza alguns milagres. Chegado o tempo da Festa da Páscoa, pega a estrada para Jerusalém como todos aqueles que viviam fora da cidade santa.
Moisés havia dito que era proibido aparecer diante de Deus com as mãos vazias (Ex 23:15). Aqueles que já moravam em Jerusalém, levavam seus animais e ofertas para o Templo; já a grande maioria dos que vinham na peregrinação, deixavam para comprar a oferta no Templo. Era mais cômodo e mais em conta. Afinal, a peregrinação era um risco. O salmo 121 relata isso muito bem. É um salmo de peregrino. Ele está procurando um deus que o auxilie a chegar bem na Festa que honra ao Senhor dos Exércitos, e acaba descobrindo que o mesmo Deus homenageado é aquele que provê a oferta e protege o ofertante.
Essa visão da soberania de Deus havia acabado. A religião estava mecanizada. O homem havia perdido o sentido da oferta, o sentido de ser um ofertante-adorador. Sendo esse ofertante, se oferece como oferta viva, como ser vivo nessa religião da peregrinação. O homem, através do tempo, deixa de entender que o verdadeiro sacrifício era aquele que deveria acontecer do lado de dentro: é o rasgar do coração e não das vestes. O homem havia perdido o sentido de festejar com coração junto da família para apenas cumprir um ritual religioso que mais causava separação entre Deus e os homens e entre os próprios homens do que proximidade, intimidade para com o homenageado. (Visto que intimidade e íntimo são coisas diferentes na Bíblia. Intimidade é para aquele que O teme.)
A bagagem era colocada sobre os animais. A festa era regrada. Muitas barracas e comércios funcionando na cidade santa. Era a atração do sagrado. Mesmo aqueles que não queriam nada com Deus se aproximavam da festa com intuitos outros. Era tempo de oportunidades financeiras, políticas. Era tempo de negociatas, barganhas. E o Templo de Deus foi transformado nisso. Ao invés do encontro festivo, bancada de negócios santos. Vendas das oferendas sem o sacrifício de tirar do seu. Estava pronto. Era comprar e devotar no altar. Era trocar por moedas e queimar em adoração.
Tudo era negócio. O Templo havia se transformado num caos. Pensavam que a barganha feita nos pátios seria tapeada no altar. Deus não aceita a oferta se antes o ofertante não for a própria oferta. Deus sempre tratou com o homem e não com coisas.
É por isso que Jesus se aproxima do Templo trazendo a sua oferta: um chicote. Ele quer tratar com o coração do homem e não com a oferta em si. Ele quer chicotear o erro e não o homem. Ele deseja corrigir a falha da festa e não ser um estraga prazer. Ele quer destruir o self, não o ser humano. Ele almeja desconstruir o que foi erigido como caminho para a oferta, para a adoração pelos homens, isto é, um caminho de ofertas compradas, de barganhas com o Divino. Jesus não quer subtrair a volição, mas a má intenção – ou até mesmo a ignorância que os destruía.
Esse texto não é claro para nós, que não possuímos o templo de tijolos como Templo da habitação exclusiva de Deus. Hoje, os judeus comemoram as festas em suas casas ou nas sinagogas. Nós, não. Nós somos esse Templo da habitação de Deus. Contudo, esse mesmo Templo da habitação exclusiva de Deus (ao menos era para ser) por vezes se corrompe, abrindo espaço para todo tipo de sujeira, negociatas e politicagem. Por isso perdemos a confiança no Deus que nos garante uma vida de adoradores e nos protege na peregrinação da vida.

Como abertura das aplicações, precisamos entender que esse Templo foi consagrado como local de oração:

Nós, como Templo de Deus, somos consagrados como local de oração, ou seja, de encontro com o homenageado, de contato de intimidade (que vem do temor – Sl 25:14) com o Santo, de oferta constante ao Senhor, de incenso aceso a todo instante.
Infelizmente, os portões desse Templo, que somos nós, se abrem à comercialização da própria alma. Vendemo-nos facilmente para aquele que trouxer o melhor preço. Nós, como Templo exclusivo de Deus, negociamos coisas santas, deixamos de tratar seriamente sobre o que é sacrifício. Muitos acabam se vendendo, deixando a consagração, o contato com Deus para se tornar Templo da barganha, dos negócios, das facilidades, das oferendas e de “quem pagar mais, leva”. É o caso do deus funcional.
Precisamos ouvir o zunido do chicote de Jesus e perceber que, diante disso tudo, a posição dEle é derrubar tudo o que achamos ser lucro, ser viável na vida religiosa, ser culto, ser oferta a Deus.
Somos consagrados em Cristo como local de oração, de encontro, de submissão, de festa, de rendição a Deus.

Perdemos a confiança quando perdemos a visão de quem promove a oferta

Uma das canções dos peregrinos é o Salmo 121. É um salmo de visão. “Elevo os meus olhos...”. O socorro vem de Deus. Os montes existiam, em uma visão mística, deuses que chefiavam o lugar. Como diante de Deus não poderia se aproximar sem oferta, o salmista questiona qual deus poderia auxiliar na colheita para a oferta. Ele mesmo responde dizendo que de Deus vem a oferta. O que isso quer dizer? Aquilo que Ele quer vem dele mesmo.
Por vezes queremos oferecer algo a Deus que não confere com o Seu desejo ou provisão. Aquilo que Deus provê, é o que Ele quer.
As mãos vazias passam a ser uma figura de linguagem. A mão nunca estará vazia no deserto, na peregrinação, no cortejo, mesmo que fúnebre, mas a caminho da festa. As mãos estarão cheias de confiança no Deus que me dá a provisão de que necessito para adorá-lo. Quando desejarmos adorar com muito e tivermos pouco, saibamos que é justamente aquilo que Deus providenciou para a nossa adoração.

Perdemos a identidade de adoradores quando perdemos a visão do sacrifício

Ao caminharem para Jerusalém, não estão desejosos de levarem as suas colheitas. Antes, preferem comprar a oferta, sem terem o sacrifício de carregá-las ao Templo.
A essência da adoração é a rendição; a essência do Adorador é a sua humanização. Sacrificar-se é interagir com seu mundo natural, de saber que precisa pagar o preço. Entender que aquilo que há de melhor não deve ser retido, antes compartilhado. Muita oferta não era queimada, mas auxiliava no sustento de sacerdotes e outros.
Perder a visão do sacrifício é perder, portanto, a sua capacidade de ser para o outro. Cristo não perdeu sua visão de sacrifício porque não perdeu sua capacidade de se dar até a morte para o outro. Deu o que tinha de melhor, sua vida. Por isso que Jesus chicoteia. Para que pudessem compreender que comprar o sacrifício não dá a alegria completa de quem oferece.

Perdemos a coragem de caminhar quando perdemos a visão do Deus que acompanha

O Salmo 121 declara que o Guarda de Israel não dormita. Ele acompanha o ofertante, o adorador. Muitos caminham para a festa sem coragem porque não aceitaram a oferta das mãos de Deus e por não fazerem parte da oferta a Deus. Eles não se oferecem a Deus, mas ofendem.

CONCLUINDO

A casa é chamada de Casa de Oração. Local de encontro. Eu preciso ser o local de encontro, em mim mesmo, do meu Deus.
Que as chicotadas do Senhor acompanhem minhas indecisões e barganhas!

NA GRAÇA, QUE ME VEM COMO OFERTA E CHICOTE
LELLIS

Extraído do blog: http://www.nelsonlellis.blogspot.com/

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